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Da Comissão de Finanças, Orçamento e Fiscalização Financeira ao Projeto de Lei Complementar nº 174/2020 (Mensagem nº168/2020), que “ESTABELECE INCENTIVOS E BENEFÍCIOS PARA PAGAMENTO DE CONTRAPARTIDA NO LICENCIAMENTO E LEGALIZAÇÃO DE CONSTRUÇÕES NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO, EM CARÁTER TEMPORÁRIO, MEDIANTE BENEFÍCIOS URBANÍSTICOS COM COBRANÇA DE CONTRAPARTIDA COMO FORMA DE VIABILIZAR RECURSOS PARA O ENFRENTAMENTO DAS CRISES SANITÁRIA E ECONÔMICA ORIUNDAS DA PANDEMIA DA COVID-19 E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS”.
Autor: Poder Executivo
Relatora: Vereadora Rosa Fernandes
(CONTRÁRIO, COM VOTO EM SEPARADO, FAVORÁVEL, VENCIDO DO VEREADOR RAFAEL ALOISIO FREITAS)
I – RELATÓRIO
O Prefeito, no uso das atribuições que lhe confere o art. 71 da Lei Orgânica, submete à deliberação da Câmara Municipal do Rio de janeiro, por meio da Mensagem nº 168, de 2020, o Projeto de Lei Complementar nº 174, de 2020, que estabelece incentivos e benefícios para pagamento de contrapartida no licenciamento e legalização de construções no município do Rio de Janeiro, em caráter temporário, mediante benefícios urbanísticos com cobrança de contrapartida como forma de viabilizar recursos para o enfrentamento das crises sanitária e econômica oriundas da pandemia da covid-19 e dá outras providências.
Na mensagem encaminhada a esta Casa de Leis, o Prefeito assevera que a proposição apresenta como objetivo principal criar mecanismo para elevar a arrecadação financeira do erário, bem como estimular a geração de empregos, por meio de incentivos, no setor de construção civil.
Com efeito, os recursos arrecadados serão destinados a suprir as necessidades financeiras do Município no custeio das ações emergenciais relativas à saúde pública, provisão de infraestrutura, habitação e assistência social para a população vulnerável aos riscos da Covid-19, bem como da folha de pagamento dos servidores, conforme o art. 1,§ 1º, da proposição.
Por sua vez, a contrapartida cobrada do contribuinte, que faculta ao proprietário a legalização da edificação, deverá ser calculada com base nos critérios da Lei Complementar nº 192, de 18 de julho de 2018, observando também as modificações propostas pelo PLC nº 174/2020.
II – VOTO DA RELATORA
Em um primeiro momento, enfatizo que ponderações relativas às implicações constitucionais e demais preceitos jurídicos foram examinados pela Comissão de Justiça e Redação, a qual apresentou parecer pela Constitucionalidade.
Salienta-se, ainda, nos termos do Regimento Interno da Câmara Municipal do Rio de Janeiro, que cabe a Comissão de Finanças, Orçamento e Fiscalização Financeira opinar sobre proposições que, diretamente ou indiretamente, alterem a despesa ou que acarretem responsabilidades ao erário municipal.
Dito isto, convém assinalar que a contrapartida, também intitulada de Mais Valia, não se trata de um tributo de competência municipal, e sim uma multa de natureza administrativa. O egrégio Tribunal de Justiça do Estado Rio de Janeiro já decidiu nesse sentido. Eis a ementa:
"APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO URBANÍSTICO. ADMINISTRATIVO. DIREITO DE CONSTRUIR. CÓDIGO DE POSTURAS MUNICIPAIS. INOBSERVÂNCIA. INCIDÊNCIA DE" MAIS VALIA ". EXAÇÃO ADMINISTRATIVA COM NATUREZA JURÍDICA DE MULTA ADMINISTRATIVA E NÃO DE TRIBUTO. FACULDADE CONCEDIDA POR LEI AO PROPRIETÁRIO PARA LEGALIZAR A EDIFICAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE LESÃO A DIREITO SUBJETIVO. PRESCRIÇÃO. REJEIÇÃO. DESPROVIMENTO DO RECURSO. 1. A questão controvertida cinge-se fundamentalmente à discussão em torno da natureza jurídica do valor cobrado como contrapartida pecuniária denominada de "mais valia". 2. Não há como conferir-se caráter tributário à verba impugnada, porquanto ausentes as necessárias características e fundamentos público-constitucionais na contrapartida cobrada em virtude da inobservância da edificação às normas edilícias municipais. 3. Estamos diante, na realidade, de multa administrativa. 4. Trata-se de uma faculdade colocada à disposição do contribuinte, pela Lei Municipal, que possibilita ao proprietário a legalização da edificação, desde que paga a contrapartida, conforme se depreende do art. 2º da Lei Complementar nº 31 de 1997. 5. Rejeição da tese de prescrição, por ausência de lesão à direito subjetivo do munícipe. 6. O não pagamento da "mais valia", mantém a edificação na ilegalidade, arcando o proprietário com o ônus da sua opção, consistente em aplicação de multas e, até mesmo, eventual demolição. 7. Desprovimento do recurso."
(TJ-RJ - APL: 02515656520108190001 RJ 0251565-65.2010.8.19.0001, Relator: DES. LETICIA DE FARIA SARDAS, Data de Julgamento: 26/03/2014, VIGÉSIMA CAMARA CIVEL, Data de Publicação: 04/04/2014 00:00)
Sendo assim, é plenamente viável vincular as receitas arrecadadas a órgãos, fundos ou despesas, sem desrespeitar o art. 167, IV, CF/88, que veda somente a vinculação de receita de impostos.
Sobre esse assunto, a Consultoria e Assessoramento Legislativo, por meio da Informação nº 13|2020, tipificou o instrumento utilizado no PLC n º174 /2020( Mais Valia), devido à sua similaridade, como outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso, cujas finalidades estão estampadas nos incisos I a VIII do art. 26 da Lei Federal nº 10.257, de 10 de julho de 2001 (Estatuto da Cidade):
“I – regularização fundiária;
II – execução de programas e projetos habitacionais de interesse social;
III – constituição de reserva fundiária;
IV – ordenamento e direcionamento da expansão urbana;
V – implantação de equipamentos urbanos e comunitários;
VI – criação de espaços públicos de lazer e áreas verdes;
VII – criação de unidades de conservação ou proteção de outras áreas de interesse ambiental;
VIII – proteção de áreas de interesse histórico, cultural ou paisagístico;”
Ainda de acordo com a Informação nº 13/2020, os recursos auferidos com a contrapartida do instrumento da Outorga Onerosa são destinados, de acordo com o art. 83 da LC nº 111/11 (Plano Diretor da Cidade), ao Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano e ao Fundo Municipal de Habitação, na proporção de 50% cada, conforme legislação citada abaixo:
Lei Complementar 111, 1 de fevereiro de 2011
(...)
Art. 83. As receitas auferidas com a adoção da outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso serão repartidas entre o Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano e o Fundo Municipal de Habitação, na proporção de cinqüenta por cento da arrecadação, ou diretamente aplicadas através de obras e melhorias, com as finalidades previstas nos incisos I a IX do artigo 26 do Estatuto da Cidade e deverão ser incluídas na Lei do Plano Plurianual - PPA, na Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO e na Lei Orçamentária Anual - LOA.
Como se vê, o art. 1º, §1º, do PLC nº 174, de 2020, da destinação contrária ao que preceitua o Plano Diretor da Cidade quando vincula as receitas arrecadadas ao custeio das ações emergenciais relativas à saúde pública, a provisão de infraestrutura, habitação e assistência social para a população vulnerável aos riscos da Covid-19 e a folha de pagamento dos servidores.
Em relação ao tema de vinculação de receitas, a Lei de Responsabilidade Fiscal é clara ao afirmar que os recursos legalmente vinculados a finalidade específica serão utilizados exclusivamente para atender ao objeto de sua vinculação, ainda que em exercício diverso daquele em que ocorrer o ingresso (art.8, parágrafo único).
Por seu turno, o art. 65 da LRF, com redação dada pela Lei Complementar nº 173, de 2020, dispensou o cumprimento do disposto no parágrafo único do art. 8º, desde que os recursos arrecadados sejam destinados ao combate à calamidade pública, o que não é verificado na referida proposição ao alocar recursos para o pagamento da folha de servidores.
Desse modo, tendo em vista que o Projeto de Lei Complementar vai de encontro ao Plano Diretor da Cidade, em especial o art. 83, e por contrariar o art. 65,§ 1º, “II” da Lei de Responsabilidade Fiscal, submeto a este colegiado o meu voto CONTRÁRIO ao Projeto de Lei Complementar nº 174/2020.
Face ao exposto, nosso voto é CONTRÁRIO ao Projeto de Lei Complementar nº 174/2020.
Sala virtual, 10 de julho de 2020.
Vereadora Rosa Fernandes
Relatora
III – CONCLUSÃO
A Comissão de Finanças, Orçamento e Fiscalização Financeira, reunida em 10 de julho de 2020, aprovou o voto da Relatora, Vereadora Rosa Fernandes, CONTRÁRIO ao Projeto de Lei nº 174/2020, de autoria do Poder Executivo, com voto em separado Favorável vencido do Vereador Rafael Aloisio Freitas.
Sala virtual,10 de julho de 2020.
Vereadora Rosa Fernandes
Presidente
Vereador Rafael Aloísio Freitas
Vice-Presidente
Vereador Prof. Célio Lupparelli
Vogal
Voto em separado
Por discordar da maioria, apresento aqui meu voto em separado. Acredito que o Projeto de Lei Complementar 174/2020, após feitas as alterações necessárias através de emendas, servirá como uma boa medida de incentivo e fomento à economia no setor da construção civil, gerando emprego e renda, que serão importantíssimos na recuperação da cidade. Sendo assim, declaro meu voto como FAVORÁVEL.
Ambiente Virtual, 10 de julho de 2020
Vereador Rafael Aloísio Freitas
Vice-Presidente