DESPACHO: A imprimir
DECISÃO DO PRESIDENTE
Por meio do presente expediente, o Senhor Vereador Paulo Messina interpõe recurso contra o ato de mister dessa Presidência que designou tão-somente as Comissões de Justiça e Redação; Administração e Assuntos Ligados ao Servidor Público e de Finanças, Orçamento e Fiscalização Financeira para exame da Emenda de nº 1, de autoria de S.Exa., apresentada ao Projeto de Lei nº 1389/2019 no transcurso da 15ª Sessão Extraordinária, realizada na pretérita terça-feira, dia 20 de agosto.
I - Do Intróito
A matéria primígena é oriunda da Mensagem nº 121 do Chefe do Poder Executivo e visa à retomada do Programa de Incentivo à Quitação de Débitos com o Município, denominado abreviadamente de CONCILIA RIO 2019. Por tramitar sob o regime ordinário, a peça emendadora que lhe fora oferecida em Plenário, conduziu automaticamente o projeto legislativo às Comissões pertinentes para análise da alteração proposta. É neste momento que se insurge S.Exa. por divergir desta Presidência quanto ao quantificativo de definição das Comissões Permanentes para examinação do mérito da propositura ora comentada.
E, assim, o nobre recorrente pondera, nas razões do seu instrumento de apelação, com estas palavras, que sintetizam a motivação da sua irresignação:
“ Apesar da complexidade da matéria aparentemente ser só tributária , isso não é verdade, pois mexer com matéria tributária gera impactos também administrativos no âmbito da execução da própria pasta, tanto que o teor da própria Emenda envolve técnicos das secretarias e, portanto, devendo a matéria ser analisada pelas Comissões pertinentes, demandando, assim, um estudo minucioso, até para que os membros das pastas possam mensurar os seus valores.”
Veja que se essa assertiva tivesse o condão da justeza, a que esta Presidência demonstrará que não, haveria o encaminhamento da Emenda de nº 1 a vinte e quatro Comissões Permanentes! Certamente, não é esse número alteroso que determinou a não designação de todas elas. Mas apenas como ilustração, é oportuno registrar que na história desta Câmara Municipal, desde os idos da sua instalação no ano de 1977, nunca houve tamanha profusão na indicação das Comissões Permanentes para opinamento sobre proposituras legislativas, como apetece o Senhor Vereador Paulo Messina e isso, em apenas, um único artigo! Diga-se aqui, comparativamente, que a média das designações mais extensas não atingiu ainda a vinte comissões, mesmo assim se referem a matérias muito mais complexas, como o Projeto de Lei Complementar nº 116/2019 (Plano de Estruturação Urbana dos bairros de Taquara, Tanque e Pechincha), totalizando doze comissões permanente, com texto normativo de cento e setenta e dois artigos; Projeto de Lei Complementar nº 43/2017, atual Lei Complementar nº 198, de 2019 (Código de Obras e Edificações), perfazendo quinze Comissões Permanentes, contendo quarenta artigos; Projeto de Lei nº 1029/2018 (Sistema Municipal de Cultura), computando dezenove Comissões Permanentes e dispondo de quarenta artigos e extenso Anexo de diretrizes temáticas, entre outras.
II – Do Despacho de Distribuição da Proposição Legislativa às Comissões Permanentes
Em vista disso, para que não paire nenhuma hesitação quanto à translucidez do despacho desta Presidência de encaminhamento da peça emendadora em tela, simplesmente, às Comissões de Justiça e Redação; Administração e Assuntos Ligados ao Servidor Público e de Finanças, Orçamento e Fiscalização Financeira, vale salientar que o procedimento de determinação das Comissões Permanentes para a apreciação dos projetos, substitutivos, emendas e subemendas apresentados à Mesa Diretora não deflui de atitude volitiva do Presidente da Câmara Municipal. Muito pelo contrário, é ato de ofício que requer impessoalidade, cumprimento ao Regimento Interno e, por vezes, a aplicação da boa interpretação teleológica e axiológica do texto da proposta legislativa para identificação da finalidade da norma pretendida e de sua efetividade.
Em síntese, não é a mera citação de uma determinada área temática que direciona a distribuição da matéria para aquela comissão permanente correspondente. Não se trata tampouco de designação imaterial, abstrata. Claro que não, porém não pode também abarcar propostas desajustadas do contexto normativo constitucional e de legalidade, como se verificará a jusante.
III – Das Inexequibilidades Existentes na Emenda
Ao impor limitações do poder de tributar, a Constituição da República diz textualmente:
“Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
...............................................................................................
II – instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, (...);
...............................................................................................
§ 6º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido, mediante lei específica, federal, estadual ou municipal que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas (...).”
Observa-se que a proposta contida no inciso II do art. 2º da Emenda de nº 1 ao PL nº 1389/2019 vincula a remissão para pagamento parcelado dos créditos oriundos do programa Mais Valia, a qual possui natureza jurídica de tributo, à verificação dos impactos na concessão do respectivo habite-se, correlacionando matéria tributária à matéria urbanística em flagrante desrespeito à vedação prevista no §6º do art. 150 da Carta Magna.
Quando se colacionam os incisos IV e VIII, do mesmo modo, se confirma também desobediência ao comando maior constitucional, pois fere o princípio da igualdade tributária inserto no inciso II do art. 150 da Constituição Federal, visto que a proposta legislativa emendadora não autoriza o alcance da lei para prestadores de serviços e empresas que atuem em funções programáticas das áreas de saúde e educação, entre outras. Todavia, com dois pesos e duas medidas, permite o benefício para aquelas que exerçam suas atividades em funções de governo das áreas de assistência social e de direitos humanos, também entre outras, com visível afronta àquele postulado tributário basilar.
Sob esse mesmo axioma, o Plano Diretor da Cidade – Lei Complementar nº 111, de 1º de fevereiro de 2011, quando cuida das políticas públicas também se expressa em conformidade com o ditame jurídico-constitucional. Vejamos:
DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA
“Art. 280. São objetivos da política de Administração Tributária:
...............................................................................................
IV – aplicar a isonomia de condições para contribuintes que se encontrem em situações semelhantes, observado o interesse social.”
Nota-se em relação ao inciso III, do art. 2º, que a proposta emendadora não atenta ao disposto no art. 172, especialmente quanto aos incisos I e V, do Código Tributário Nacional, com simetria no art. 211 do Código Tributário do Município, nestes termos:
“Art. 172. A lei pode autorizar autoridade administrativa a conceder, por despacho fundamentado, a remissão total ou parcial do crédito tributário, atendendo:
...............................................................................................
I – à situação econômica do sujeito passivo;
...............................................................................................
V – às condições peculiares à determinada região do território da entidade tributante.”
Para esse caso, a Emenda de nº 1 aplica o instrumento da remissão indistintamente, tanto para microempresas como para as grandes empresas, sem levar em consideração a capacidade contributiva e a dificuldade econômica decorrente da decadência ou esvaziamento das atividades empreendedoras em certas regiões geográficas da Cidade.
Por sua vez, quanto ao inciso VII do art. 2º da proposta emendadora, o objetivo é impedir que sejam beneficiadas pelo parcelamento as empresas que desrespeitem o meio ambiente. Esse dispositivo previsto na Emenda de nº 1 é inócuo diante da existência da Lei Municipal nº 906, de 25 de setembro de 1986, que já prenuncia há mais de trinta anos:
“Art. 1º. Fica proibida a concessão de benefícios no pagamento de créditos tributários devidos ao Município às empresas que agridam o meio ambiente, transgredindo a legislação pertinente no âmbito municipal, estadual e federal, sem prejuízo de outras penalidades já previstas legalmente.
Art. 2º. Considera-se como benefícios, para os efeitos da presente Lei:
I – parcelamento e remissão;
II – anistia;
III – isenção e redução da base de cálculo.”
Vale lembrar que a Lei nº 906, de 1986, consta do Decreto nº 42.838, de 18 de janeiro de 2017, na última consolidação das leis tributárias em vigor no Município, elaborada pela Secretaria Municipal de Fazenda e, portanto, admite-se que já exista o cadastro dessas empresas infratoras, sendo despicienda a alteração emendadora em comento.
Ora, se como vimos, todas essas modificações pretendidas pela Emenda de nº 1 constituem disposições natimortas, à conta da pecha do impedimento constitucional ou de sua ineficácia, não há porque, pela sua insubsistência, considerar que tenham mérito administrativo programático.
IV – Da Aplicação da Interpretação Teleológica e Axiológica da Emenda de nº 1 ao PL 1389/2019
No segundo tópico deste breve comentário, foi dito que a interpretação teleológica e axiológica subsidia eventualmente o despacho do Presidente desta Casa de Leis na designação das Comissões Permanentes para análise das proposituras legislativas. Na origem da apresentação do Projeto de Lei nº 1389/2019, bem como na edição de suas propostas anteriores, houve metodicamente o encaminhamento da matéria tão-somente às Comissões de Justiça e Redação, Administração e Assuntos Ligados ao Servidor Público e de Finanças, Orçamento e Fiscalização Financeira.
Apenas como exercício cognitivo, sem considerar os pressupostos do tópico anterior, por que a Emenda de nº 1 ao PL 1389/2019 não foi enviada a outras Comissões Permanentes, se ela fazia menção expressa a específicas áreas temáticas?
É o que aqui vai se expor para dirimir a cizânia levantada pelo nobre edil reclamante.
Para a definição das Comissões Permanentes a ser distribuída a proposta legislativa, há que se caracterizar e reconhecer a finalidade precípua da norma e de sua aplicação real. Para isso, há que se ter como pressuposto que, afora a Comissão de Justiça e Redação que funciona como órgão técnico-jurídico, as demais tratam-se de colegiados de mérito congruentes a campos temáticos ou áreas de atividade específica.
Contudo, é imprescindível que se faça uma disjunção das Comissões de Administração e Assuntos Ligados ao Servidor Público e de Finanças, Orçamento e Fiscalização Financeira dos demais colegiados permanentes, porque estas possuem a particularidade do mérito de gestão pública, administrativa e financeira. As outras são notadamente de natureza programática social, econômica, urbanística, além de outras áreas, e o maior atributo delas é ensejar o imediato interesse público.
Prosseguindo nesse silogismo de intelecção, pode-se admitir que inexiste ambiguidade entre interesse público e interesse de Estado. Na melhor doutrina administrativa, classifica-se o interesse público em duas categorias: o interesse público primário e o interesse público secundário.
Segundo Raquel Cavalcanti Ramos Machado, doutora em Direito Tributário pela Universidade de São Paulo, sobre “A invocação do interesse público em matéria tributária”, extrai-se o seguinte excerto:
“Interesse público primário é aquele relacionado de modo imediato com as necessidades do povo, como educação, saúde, moradia, etc. Interesse público secundário diz respeito ao uso dos meios necessários à realização desses anseios do povo, tais como a arrecadação de tributos.”
É sob essa premissa maior que se percebe que o tema REMISSÃO de créditos tributários ou não constitui assunto peculiar ao interesse de Estado e não ao interesse público imediato, porque aqueles contribuintes que se beneficiam da aplicação desse instrumento tributário não é a coletividade, mas sim algumas pessoas. Veja que as pessoas físicas e jurídicas que efetuaram o pagamento de créditos do Município, dentro do prazo previsto na legislação, não dispuseram de benesse ou qualquer outro benefício. Enquanto isso, aqueles que não cumpriram suas obrigações tributárias no prazo legal se beneficiam do parcelamento e da redução dos valores dos acréscimos monetários.
Não há que se falar neste caso de interesse público coletivo, imediato, mas sim do interesse de Estado, de modo a evitar o excesso de judicialização, que acaba tornando mais lenta e custosa a recuperação do crédito e possibilitar o recrudescimento dos índices arrecadatórios, conforme expressões, ipsis litteris, que constam da Mensagem do Chefe do Poder Executivo quando remeteu a esta Casa de Leis a Mensagem que originou o PL nº 1389/2019.
Pois bem, se está caracterizado o interesse maior de Estado nas matérias de remissão, não importa se há citação de outras áreas de atividade governamental, o mérito será de gestão administrativa e financeira, tão-somente, portanto, inerente às Comissões de Administração e Assuntos Ligados ao Servidor Público e de Finanças, Orçamento e Fiscalização Financeira, respectivamente, a não ser que fique evidenciado expressamente o interesse público coletivo, específico e imediato, tal como ocorreu, por exemplo com a apresentação do PL nº 28/2017, de autoria dos Senhores Vereadores Felipe Michel, Luiz Carlos Ramos Filho e Cláudio Castro, que prevê a remissão de créditos referente ao Imposto Predial e Territorial Urbano – IPTU para os proprietários ou ocupantes de imóveis edificados atingidos por enchentes, alagamentos e desmoronamentos.
Por fim, vale registrar que embora o autor da Emenda de nº 1 clame pelo opinamento de mais outras vinte e uma Comissões Permanentes, nenhuma delas se manifestou dentro do prazo regimental, reivindicando in casu a competência estatutária. Se assim não fazem, mantendo-se silentes, depreende-se a concordância delas com despacho da Presidência.
V – Da Decisão sobre o Recurso
Em sendo assim, diante desta explanação de esclarecimento, a Presidência mantém IMUTÁVEL o despacho de designação das Comissões Permanentes para exame da Emenda de nº 1 ao PL nº 1389/2019 e, destarte, DENEGA PROVIMENTO ao recurso impetrado pelo Senhor Vereador Paulo Messina, nos termos do art. 289, §1º, do Regimento Interno.
Publique-se. Dê-se prossecução ao recurso, encaminhando-o ainda hoje à douta Comissão de Justiça e Redação para pronunciamento e posterior deliberação pelo Excelso Plenário desta Casa de Leis..
Em 26/08/2019
JORGE FELIPPE - Presidente
|