Com a devida permissão e pelos motivos abaixo, resta evidente que o expediente acima está equivocado, visto que a matéria tratada no Projeto de Lei proposto não adentra na competência privativa do Sr. Prefeito.
2. DA DEVOLUÇÃO DAS PROPOSITURAS DOS VEREADORES.
O despacho indica o art. 194, I do Regimento Internos da Câmara, que por sua vez prescreve: “serão restituídos ao autor as proposições manifestamente anti-regimentais, ilegais ou inconstitucionais”. Entendemos que esta regra visa proteger a Câmara de iniciar a tramitação de projetos com inconvenientes em função do não cumprimento daqueles requisitos.
Entretanto, tais inconsistências não são verificadas no projeto transcrito a seguir.
3. DO PROJETO DE LEI DEVOLVIDO.
O Projeto de Lei abaixo transcrito na íntegra não cria cargos, empregos ou função pública, como também não aumenta a remuneração dos servidores ou modifica a estrutura das Secretarias Municipais nele citadas, bem como suas atribuições.
O referido projeto, apenas cria um “Programa de Apoio”, completamente inserido no escopo institucional das secretarias municipais.
Mais ainda, o projeto irá facilitar o acesso aos recursos estaduais e federais voltados para o tema nele tratado.
Dito isto, vejamos o texto da propositura:
INSTITUI O PROGRAMA DE APOIO À RECUPERAÇÃO DO DEPENDENTE QUÍMICO NO ÂMBITO DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO.
Autor(es): Veredora TERESA BERGHER
A CÂMARA MUNICIPAL DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO
RESOLVE:
Art. 1º - Institui, no âmbito da Secretaria de Municipal de Assistência Social – SMAS, o Programa de Apoio à Recuperação do Dependente Químico com o objetivo de desenvolver ações, programas e atividades de prevenção, tratamento, recuperação e reinserção social de dependentes de substâncias psicoativas.
Parágrafo único. Serão considerados os serviços próprios de atenção e reinserção social de usuários e dependentes de drogas realizados pelas instituições, através de clínicas, casas, comunidades terapêuticas ou pessoa jurídica cujo objeto social faça previsão das atividades descritas no caput deste artigo.
Art. 2º - Para a execução do Programa, as pessoas jurídicas sem fins lucrativos, que atendam usuários ou dependentes de drogas, poderão receber recursos da Secretaria Municipal de Saúde – SMS e da Secretaria de Municipal de Assistência Social – SMAS, bem como de programas estaduais e federais sobre os temas tratados nesta lei, através das secretarias acima citadas, condicionados à sua disponibilidade orçamentária e financeira, bem como a observância da legislação vigente.
§1º - Fica autorizado a Secretaria de Municipal de Assistência Social – SMAS e Secretaria Municipal de Saúde - SMS firmar convênio para disciplinar as atividades conjuntas tangentes ao programa de que trata esta lei, bem como sobre os repasses ou transferências de recursos.
§2° - Os repasses financeiros serão escalonados de acordo com o porte das pessoas jurídicas em função da sua capacidade de atendimento e acolhimento.
§3° - As pessoas jurídicas de Direito Privado enquadradas no art.2 acima poderão aderir ao Programa voluntariamente.
Art. 3º - O Poder Executivo regulamentará a operacionalização do Programa.
Art. 4º - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.
Plenário Teotonio Villela, junho de 2011.
A Justificativa também esclarece a finalidade da propositura, a saber:
O Programa de Apoio à Recuperação do Dependente Químico nasce com a urgência de levar o atendimento o mais próximo possível dos usuários e dependentes de drogas no território do município.
A iniciativa segue a lei já aprovada na Assembléia Estadual em junho de 2011 e vai somar às ações voltadas aos moradores de rua da cidade, visto que muitos deles possuem problemas com drogas.
O tratamento da dependência química, embora envolva diversas ações, tais como: psicoterapia, medicamentos, internação e etc. – deve ser individualizado e projetado de acordo com as necessidades do paciente e da família.
Não existe um tratamento único que atenda a todos os dependentes químicos. O plano de tratamento mais adequado deve ser discutido e analisado cuidadosamente em cada caso com o paciente e com a família. Alguns precisarão tomar medicamentos, outros não. A grande maioria não precisa ser internada, mas alguns precisam. Outros terão como indicação uma psicoterapia, ou terapia familiar, assim por diante.
O apoio da municipalidade às instituições multiplicará a rede de prestação de serviços de alto interesse público, reorganizando o atendimento.
Sendo assim, confiamos no apoio dos nobres Vereadores para apoiar e aprovar a presente iniciativa.
Ressaltamos, destarte, que a propositura não atinge a competência privativa do Chefe do Poder Executivo, pelo contrário, encontra amparo na própria legislação citada no despacho que aqui estamos recorrendo ao Plenário.
4. DOS DISPOSITIVOS LEGAIS SUBJACENTES À MATÉRIA.
Alega o Exmo. Sr. Presidente que a propositura adentrou nas matérias presentes no art. 71, II da Lei Orgânica do Município (doravante LOM). Vejamos:
Art. 71 - São de iniciativa privativa do Prefeito as leis que: (...) II - disponham sobre: (...) b) criação, extinção e definição de estrutura e atribuições das secretarias e órgãos de administração direta, indireta e fundacional; c) concessão de subvenção ou auxílio, ou que, de qualquer modo, aumentem a despesa pública; (...) e) as matérias constantes do art. 44, incisos II, III, VI e X.
(Alteração dada em vista da Declaração de Inconstitucionalidade do art. 71, inciso II, letra e, por OMISSÃO DO INCISO V, pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça. (Representação nº 46/93 - Acórdão de 16.10.95 - Publicado no Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro - Poder Judiciário)
§ 1º - A iniciativa privativa do Prefeito na proposição de leis não elide o poder de emenda da Câmara Municipal.
§ 2º - A sanção do Prefeito convalida a iniciativa da Câmara Municipal nas proposições enunciadas neste artigo. Também o despacho publicado faz referência ao art. 107, V, cujo teor transcrevemos: Art. 107 - Compete privativamente ao Prefeito: (...) V - vetar projetos de lei, total ou parcialmente;
Notamos que a competência para vetar os projetos de lei aprovados na Câmara Municipal não pode ser fundamento para a não tramitação dos projetos do Vereadores, pois se este entendimento vigorar, não faz sentido apresentar qualquer iniciativa legislativa dos citados atores políticos.
Neste passo, transcrevemos o art. 44 da LOM:
Art. 44 - Cabe à Câmara Municipal, com a sanção do Prefeito, legislar sobre todas as matérias de competência do Município e especialmente sobre:
I - sistema tributário, arrecadação e aplicação de rendas;
II - plano plurianual, diretrizes orçamentárias, orçamento anual, operações de crédito e dívida pública (Alteração dada pela Emenda à Lei Orgânica nº 12, de 2002);
III - políticas, planos e programas municipais, locais e setoriais de desenvolvimento;
IV - criação, organização e supressão de regiões administrativas e distritos no Município;
V - concessão de isenções e anistias fiscais e remissão de dívidas de créditos tributários;
VI - organização da Procuradoria Geral do Município;
VII - organização do Tribunal de Contas do Município e de sua Procuradoria Especial;
VIII - criação, transformação e extinção de cargos, empregos e funções públicas;
IX - criação, extinção e definição de estrutura e atribuições das secretarias e órgãos da administração direta, indireta e fundacional do Município.
X - matéria financeira e orçamentária;
XI - montante da dívida mobiliária municipal;
XII - normas gerais sobre a exploração de serviços públicos;
XIII - autorização para proceder à encampação, reversão ou expropriação dos bens de concessionárias ou permissionárias e autorizar cada um dos atos de retomada ou intervenção;
XIV - tombamento de bens móveis ou imóveis e criação de áreas de especial interesse;
XV - fixação e modificação do efetivo das guardas municipais previstas no art. 30, VII. (NR)
Apenas por argumentação poderíamos combinar o art. 44, III com o 71, II, alínea “e”. Em outras palavras, nesta combinação poderia residir o único argumento impeditivo ao curso normal do Projeto de Lei acima transcrito. Isto porque a LOM faz uma remissão da competência legislativa da Câmara Municipal quando trata da competência privativa do Chefe do Poder Executivo.
Em que pesa a redação ruim da LOM neste tema, não basta uma leitura literal, mas é preciso um pouco de investigação do sentido e dos objetivos daqueles dispositivos.
Com efeito, o sentido de “programa” (e aqui reside o único elo com a suposta invasão de competência) deveria estar substanciado com outras medidas, tais como: modificação de estrutura funcional, aumento de despesas, dentre outras que realmente adentrem nas faculdades do Poder Executivo.
Em uma leitura atenta da propositura devolvida (art.3 por exemplo), nada daquilo acontece, pelo contrário, as faculdades do Poder Executivo estão mantidas, visto que caberá ao mesmo regulamentar a matéria!
Pelos dispositivos citados, não encontramos obstáculo à proposição devolvida, sobretudo porque o Prefeito pode convalidar as iniciativas desta Casa de Leis.
5. DO PEDIDO.
Em face da exposição acima e na evidência que o despacho ora recorrido foi uma aplicação desmedida da legislação pedimos:
a) Que o Exmo. Sr. Presidente reconsidere seu despacho publicado em 12 de julho de 2011 no DCM, pelos motivos aqui evidenciados; ou, na manutenção do seu entendimento;
b) Que o presente RECURSO seja processado na forma regimental (Art.288), sendo seu teor levado ao conhecimento do Plenário com a nossa confiança em sua aprovação.
Rio de janeiro, 14 de julho de 2011.
Observações:
Comissões a serem distribuidas 01.:Comissão de Justiça e Redação