Ementa do Acórdão
| ÓRGÃO ESPECIAL
REPRESENTAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 12/2019 – 0001870- 17.2019.8.19.0000
REPRESENTANTE: ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE SHOPPING CENTERS - ABRASCE
REPRESENTADO: MESA DIRETORA DA CÂMARA DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO
RELATOR: DES. ANTÔNIO CARLOS NASCIMENTO AMADO
LEI MUNICIPAL Nº 6.459, DE 8 DE JANEIRO DE 2019
A C Ó R D Ã O
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO. LEI N. 6459/2019. INSTITUI O CRÉDITO DE MINUTOS PAGOS E NÃO UTILIZADOS NOS ESTACIONAMENTOS NA FORMA QUE ESPECIFICA E DÁ OUTRAS PROVIDÊNCIAS.
Representação de Inconstitucionalidade proposta pela Associação Brasileira de Shopping Centers - ABRASCE, referente à Lei Municipal do Rio de Janeiro n. 6.459, de 09 de janeiro de 2019, que “Institui o crédito de minutos pagos e não utilizados nos estacionamentos na forma que especifica e dá outras providências”.
Este Tribunal, por duas vezes, já teve a oportunidade de analisar leis que regulam temas idênticos, uma delas editada pelo próprio Município do Rio, não sendo diferente, ou novo, o tema do presente processo.
Norma que padece dos vícios de inconstitucionalidade formal e material, de modo que usurpa a função privativa da União de legislar sobre as normas de Direito Civil, a teor do art. 22, I, da Constituição da República Federativa do Brasil, bem como viola os princípios da livre iniciativa e livre concorrência, bem como da razoabilidade e proporcionalidade.
Constituição do Estado, seguindo a Republicana que reza, em seu artigo 358, que compete aos municípios legislar sobre assuntos de interesse local, bem como suplementar a legislação federal e a estadual no que couber, dentre outros assuntos.
Existência de dois grupos de competência legislativas: competências exclusivas, previstas no artigo 358, I e III, da CERJ, e 30, I e III, da CRFB, e suplementares, descritas no artigo 358, II, da CERJ, e 30, II, da CRFB.
Competências exclusivas: a legislação municipal deve estar adstrita aos assuntos de interesse predominantemente local, ou seja, referentes às peculiaridades do município, não bastando que se trate de uma questão que qualquer município enfrente, como regra. Nesse caso, trata-se de repartição horizontal, ou seja, os entes estão no mesmo nível hierárquico, o que determina a prevalência da lei municipal, no caso de conflito, sobre qualquer outra, seja federal o estadual.
Competências suplementares: quando as Constituições falam em suplementar a legislação federal e estadual “no que couber”, exigem, da mesma forma, que esse suplemento seja de interesse predominantemente local. Ademais, como norma municipal suplementar, está subordinada à repartição vertical de competências, ou seja, às leis da União e do respectivo estado, o que condiciona o exercício de tal competência legislativa à existência de legislação federal ou estadual sobre o assunto.
Suplemento, ademais, que somente pode ocorrer em legislação estadual ou federal de competência concorrente, sendo vedada a existência de leis municipais para suplementar leis federais ou estaduais decorrente de competência exclusiva ou privativa da União e dos Estados-membros, a menos que a competência privativa da União se restrinja, expressamente, a estabelecer normas gerais (ex vi artigo 22, XXI e XXVII, da CRFB).
Supremo Tribunal Federal que já firmou entendimento no sentido de que a regulação de preço de estacionamento é matéria de Direito Civil, regulando direito à propriedade privada, inserindo-se, portanto, na competência privativa da União para legislar, na forma do artigo 22, I, da CRFB/88.
Tratando-se de competência exclusiva e não tendo a constituição, nessa hipótese, limitado a competência da União às regras gerais sobre o assunto, afasta-se a competência legislativa suplementar dos municípios. Inconstitucionalidade formal verificada.
Ainda que se considerasse ser o caso de matéria consumerista, abrangida, portanto, pela competência legislativa concorrente entre União, Estados e Distrito Federal (artigo 24, V, da CRFB/88), a lei municipal ora impugnada ainda assim estaria eivada de inconstitucionalidade formal.
Primeiro, porque somente os Estados e o DF possuem competência concorrente, de modo que, não havendo lei da União ou do Estado do Rio de Janeiro sobre o tema, descabe suplementação pelo Município.
Em segundo lugar, acaso houvesse lei do Estado do Rio de Janeiro ou da União, a questão relativa ao preço cobrado pelos estacionamentos em shopping centers não é peculiar do Município do Rio de Janeiro, ou seja, não está abrangida pelo que se entende por assuntos de interesse local, o que, de qualquer forma, impediria a suplementação pelo Município. Inconstitucionalidade material também verificada. Evidente ao princípio da livre iniciativa, segundo o qual somente em razão do interesse público a iniciativa privada pode ser limitada, princípio previsto nos artigos 5º e 215, da CERJ.
Lei, por fim, que prevê a imposição de multa de cem vezes o valor cobrado pela hora no estacionamento, sendo dobrada a cada reincidência, o que, ademais, é desproporcional.
PROCEDÊNCIA DA AÇÃO. MAIORIA. |