Ementa do Acórdão
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REPRESENTAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE nº 240/2020 - 0058849-62.2020.8.19.0000
REPTE: PROCURADOR GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
REPDO: PREFEITO DO MUNICIPIO DO RIO DE JANEIRO
REPDO: PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DO RIO DE JANEIRO
AMICUS CURIAE: ASSOCIAÇÃO DE DIRIGENTES DE EMPRESAS DO MERCADO IMOBILIÁRIO - ADEMI-RJ
AMICUS CURIAE: SINDICATO DA INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO CIVIL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO - SINDUSCON-RIO
AMICUS CURIAE: CAPÍTULO NACIONAL BRASILEIRO DA FEDERAÇÃO INTERNACIONAL DAS PROFISSÕES IMOBILIÁRIAS
AMICUS CURIAE: CONSELHO DE ARQUITETURA E URBANISMO DO RJ - CAU/RJ
AMICUS CURIAE: ASSOCIAÇÃO DE MORADORES E AMIGOS DA FREGUESIA AMAF
AMICUS CURIAE: ASSOCIAÇÃO DE MORADORES E AMIGOS DO JARDIM BOTÂNICO AMAJB AMICUS CURIAE: FEDERAÇÃO DOS HOSPITAIS E ESTABELECIMENTOS DE SERVIÇOS DE SAUDE DO ESTADO DO RJ - SINTRACONST RIO
RELATOR: DES. ANTÔNIO ILOÍZIO BARROS BASTOS
LEGISLAÇÃO: LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL Nº 219, DE 19 DE AGOSTO DE 2020, E, POR ARRASTAMENTO, O DECRETO Nº 47796, DE 2020, AMBOS DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO
REPRESENTAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI COMPLEMENTAR MUNICIPAL NR. 219, DE 2020. BENEFÍCIOS URBANÍSTICOS COM COBRANÇA DE CONTRAPARTIDA COMO FORMA DE VIABILIZAR RECURSOS PARA O ENFRENTAMENTO DAS CRISES SANITÁRIA E ECONÔMICA ORIUNDAS DA COVID-19. 1. Representação de Inconstitucionalidade que tem em mira a Lei Complementar Municipal nº 219, de 19 de agosto de 2020, que estabelece incentivos e benefícios para pagamento de contrapartida no licenciamento e legalização de construções no Município do Rio de Janeiro, em caráter temporário, mediante benefícios urbanísticos com cobrança de contrapartida como forma de viabilizar recursos para o enfrentamento das crises sanitária e econômica oriundas da COVID-19 e dá outras providências; além da inconstitucionalidade por arrastamento do Decreto nº 47.796, de 2020, que a regulamenta. 2. O Representante traz o seguinte elenco de dispositivos da CERJ que foram violados pela lei complementar ora impugnada, são eles: artigos 9º, § 4º, 77, caput, 122, caput, 229, caput, 230, inciso II, 231, caput e § 1º, 3° e 5°, 234, incisos I, III, V e VIII, 235, 236, 239, 261, caput, § 1º, incisos I, II, III, IV, V, IX, X, XXIV e XXV, e § 2º, 266, § 1º, 268, 269, incisos I, II, V e VI, 345, caput e inciso VII, e 359, caput. 3. Litispendência afastada com a Ação Civil Pública nº 0139148-23.2020.8.19.0001, que foi extinta; inépcia da inicial afastada já que observada a regra do art. 3º, I da Lei 9868/99; no mais, não se vislumbra qualquer ingerência indevida senão a crítica ao descompasso entre a LCM 219/2020 e a Constituição, sendo certo que os parâmetros de controle são oriundos da CERJ, além daquelas normas de reprodução obrigatória que podem e devem servir de parâmetro para análise da normativa local. 4. O sistema constitucional estabelece a necessidade de planejamento urbanístico para fins de desenvolvimento eficaz das funções sociais da cidade. A LC 219/20 vai de encontro ao intuito constitucional que é de fomentar o planejamento urbano coordenado. Vislumbra-se o descompasso entre a referida lei e o sistema constitucional que exige a compatibilidade da intervenção legislativa e o planejamento urbanístico coordenado. Em termos, o sistema constitucional idealizado ao planejamento que potencializa a realização das funções sociais da cidade exige que a lei que enverede pelo ordenamento territorial deva ser adequada, observando diretrizes do plano diretor que se insere dentro dessa lógica constitucional. 5. O sistema constitucional quando trata de política de desenvolvimento urbano, prestigia a gestão democrática e participativa da cidade a fim de assegurar a participação popular efetiva. A democracia participativa consubstancia uma das dimensões do princípio democrático, sendo certo que para sua efetivação impõe-se a estruturação de processos que garantam a efetiva possibilidade de participação nos debates públicos que levarão às tomadas de decisão. A consequência positiva dessa participação está na legitimação das decisões tomadas e o aprimoramento dos objetivos e resultados que se busca com a lei. No trâmite legislativo que culminou na lei em foco essa exigência constitucional não foi devidamente observada. 6. É sabido que a CERJ prevê a necessidade e importância de estudos técnicos de impacto ambiental quando se fala em transformações de uso do solo. É inegável a importância de estudos técnicos para potencializar o atendimento ao pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e a compatibilidade entre a lei e o espírito da CERJ no tema de política urbana. Nessa perspectiva, uma lei que cuida de transformações do tipo sem que haja no seu processo de formação o necessário e devido estudo reflete uma frontal incompatibilidade com a CERJ. No caso, a lei complementar impugnada não está substanciada de forma adequada nesses estudos. 7. Vislumbra-se na lei complementar impugnada, para além de despesas emergenciais e momentâneas, despesas duradouras que se protraem em diferentes exercícios financeiros, o que exige estudo prévio avaliativo dos impactos orçamentários e financeiros, sob pena de comprometimento da sustentabilidade financeira e o equilíbrio intergeracional. A lei carece desses estudos. 8. O que se percebe é a violação ao princípio da economicidade, implícito no art. 112 da CERJ, que exige um controle da eficiência voltado à adequação e equilíbrio entre receita e despesa. No caso da lei em mira, não se vislumbra tal adequação entre receita a custo de benefício supervalorizado e os impactos de despesas que, a rigor, vão além da órbita restrita na questão da crise gerada pela pandemia do Covid-19. Nesse cenário, viola-se também os princípios da moralidade, interesse público, proporcionalidade e vedação do retrocesso ambiental. 9. REPRESENTAÇÃO PROCEDENTE, COM EFEITOS A PARTIR DO DEFERIMENTO DA MEDIDA CAUTELAR. |