O Engo. Ibá dos Santos Silva, primeiro administrador do Parque Estadual da Chacrinha (PEC), desde o início dos anos 1980 ouvia narrativas de militares e de outras pessoas que conheciam a área a respeito de uma possível passagem de Tiradentes por esse trecho de Copacabana.
Pesquisas mais recentes, apresentadas parcialmente no livro “Tiradentes Carioca, as relações dos inconfidentes com o Rio de Janeiro” (Mansur, A.L. & Morais, R.; 2017; pág. 18), indicam que o então Alferes Joaquim José da Silva Xavier serviu no Reduto do Leme entre 1776 e 1779, em sua primeira passagem pelo Rio de Janeiro. Segundo os Autos da Devassa da Inconfidência Mineira, Tiradentes sentou praça no Rio de Janeiro em 1º de dezembro de 1775 e serviu na 6ª Companhia do Regimento de Cavalaria Regular da Capitania de Minas Gerais, que ajudou a guarnecer a cidade contra uma esperada e não concretizada invasão da Armada Espanhola.
Mas nada foi tão real quando não saiu de nossa boca ou de onde menos se esperava: uma pesquisa em que a Profa. Camilla Agostini, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), registrou relatos dos antigos moradores do PEC removidos em 1972 durante a ditadura militar, que se referiram a um lugar bastante peculiar existente naquela encosta, denominado de Gruta de Tiradentes.
Na verdade, não se trata de uma “gruta” propriamente dita, mas de pequenas cavidades formadas pela superposição de blocos de gnaisse facoidal desprendidos da encosta do Morro de São João, onde são observadas alvenarias do que parece ter sido um antigo depósito. É bastante provável que estes “abrigos-sob-rocha” tenham servido aos militares que faziam a “atalaia” do litoral desde o final do século XVIII, e que o famoso Alferes tenha por lá passado muitas vezes naqueles anos de serviço no Forte da Vigia.
Lenda ou não, o local reveste-se de importância pelo fato de Joaquim José da Silva Xavier constituir um herói nacional, um mártir de nossa Independência e Liberdade, bem como um pioneiro na luta pelo uso soberano sobre os nossos recursos.
Neste último dia 21 de abril, completaram 230 anos do martírio de Tiradentes, aquele que segundo o imortal samba da Império Serrano de 1949, “Exaltação a Tiradentes” (Mano Décio da Viola, Estanislau Silva e Arlindo Penteado), “foi traído e não traiu jamais”.
Quando o povo diz o que não é dito em nenhum lugar e por outros à boca pequena aí a se passa a acreditar na veracidade. Quem iria colocar na boca do povo essa passagem da História de Tiradentes no Rio de Janeiro?
A História de um lugar – Mas, para que a haja fundamento, é necessário que o local tenha uma História condizente com os fatos. A história do PEC começa ainda no século XVI com as Ordenações Manuelinas que vigoraram de 1521 até 1595.
A cidade do Rio de Janeiro foi fundada ao lado do Pão de Açúcar, bem perto da entrada da Baía de Guanabara, em local escolhido estrategicamente. Após a expuls~]ao definitiva dos franceses e a derrota da Confederação Tamoio, a cidade foi transferida para o Morro do Castelo, no Centro atual. Mas se a barra da baía de Guanabara foi guarnecida com fortalezas em ambos os lados, fora da baía restavam pontos vulneráveis à invasão por tropas estrangeiras. O lugar mais sensível era onde se localiza hoje a Rua Coelho Cintra, conhecida como Ladeira do Leme.
Ali, onde hoje existem dois arcos de pedra tombados pelo Instituto Estadual do Patrimônio Artístico e Cultural, havia uma fortaleza que compunha o “Sistema de Defesa da Cidade do Rio de Janeiro”, mandada erguer pelo Marquês do Lavradio, oitavo Vice-Rei do Brasil (https://pt.wikipedia.org/wiki/Ant%C3%B3nio_de_Almeida_Soares_Portugal).
Há que se refletir sobre a fragilidade da cidade do Rio de Janeiro, posto que em maio de 1710 o corsário francês Jean-François Duclerc tentou tomar a cidade, só não conseguindo porque as forças portuguesas foram avisadas antecipadamente. Os franceses perderam o fator surpresa e foram derrotados. Ainda assim, o governador Francisco de Castro Moraes alertou a metrópole em carta ao Rei Dom João V, que a cidade do Rio de Janeiro estava mal guarnecida, com fortificações e mal estado ou inacabadas, sem tropas em número suficiente e com armamentos inadequados. No dia 14 de setembro de 1711, uma grande expedição francesa comandada pelo corsário René Duguay-Trouin, entrou na Baía de Guanabara com uma esquadra de 15 navios e mais de 5.400 homens, e tomou a cidade do Rio de Janeiro, permanecendo ali até o dia 13 de novembro daquele ano. (https://super.abril.com.br/historia/duguay-trouin-o-navegante-que-sequestrou-o-rio/)
Após as invasões francesas, foi instalada no Morro do leme, no colo que liga Botafogo a Copacabana, um posto de vigia com uma pequena peça de artilharia, para avisar da aproximação de navios vindos de sudoeste. Ainda assim, a cidade continuou mal fortificada por mais algumas décadas, quando o 2º Marques do Lavradio (1729-1760), Vice-Rei do Brasil entre 1769 e 1778, mandou erguer o Sistema de Defesa da Cidade do Rio de Janeiro para proteger a cidade de forma mais eficiente.
Arcos sobre a Ladeira do Leme (http://rioantigofotos.blogspot.com/2009/12/origem-do-arco-do-leme-foto-do-rio.html)
Os arcos da ladeira do Leme faziam parte da Fortaleza da Vigia, que servia para vigiar a circulação de navios de bandeiras estrangeiras pela costa brasileira, que só podiam aportar em locais determinados para a “aguada” e adquirir víveres.
E um desses locais, localizado fora da Baía de Guanabara, era exatamente o Reduto do Leme, região situada entre a Pedra do Leme e a atual Rua República do Peru, onde havia a Pedra do Inhangá, que separava o Reduto da antiga Copacabana. Esse local era um Posto de Aguada, que era um tratado entre nações que, mesmo sendo inimigas, tinham que deixar aportar navios para troca de mantimentos e água para seguir viagem. O escorbuto que matou muitos marinheiros resultou no Tratado de Direito de Aguada.
O Local era vigiado por soldados da Fortaleza da Vigia e quem habitava a região foram, por ordem, os tupinambás, os negros-de-ganho, os pescadores, os chacareiros, junto à atual Rua Tonelero.
O escorbuto afetava os dentes e debilitava o organismo.
Por isso, aquilo que cala na alma do povo é imagem que fica: A Gruta de Tiradentes no atual Parque Estadual da Chacrinha, primeiro parque estadual do Estado do Rio de Janeiro, pleno de plataformas do tempo do Brasil Colônia, tombadas pelo IPHAN e abandonadas.
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